A Missa de Diálogo, uma Ferramenta para Democratizar a Liturgia

Dr.ª Carol Byrne, Grã-Bretanha

O ano de 1909 marca o momento decisivo em que o germe da decadência entrou na cena litúrgica e lentamente começou a devorar os ritos tradicionais por dentro. Foi nesse ano que Dom Lambert Beauduin apresentou suas ideias para uma participação mais “ativa” dos leigos na liturgia, durante o Congresso Nacional da Ação Católica de Malines, a convite do Cardeal Désiré Joseph Mercier.

Seu discurso, intitulado La Vraie Prière de l’Église (“A Verdadeira Oração da Igreja”), foi posteriormente publicado como parte do livro La Piété de l’Église (“A Piedade da Igreja”), em 1914 (1). Nele, Beauduin propôs um plano “pastoral” que, segundo afirmava, estaria de acordo com as diretrizes do Papa Pio X sobre a “participação ativa”.

Entre outras coisas, mencionou sua proposta de familiarizar os leigos com o texto da Missa e do Ofício Divino, por meio do uso generalizado de missais manuais bilíngues.

A ideia por trás da proposta era, segundo ele, cumprir o objetivo de Pio X de ajudar os leigos a alcançar um grau maior de participação na liturgia, considerada por este Papa como “fonte primária e indispensável do espírito cristão”.

Todos terão missais

Mas havia muito mais por trás dessa estratégia aparentemente inócua. Uma grande revolução já vinha fermentando em sua mente, e o Congresso de 1909, em Malines, foi apenas a primeira plataforma pública para ideias que ele vinha ruminando havia algum tempo.

No topo da agenda estava a proposta de publicar e divulgar milhares de missais com tradução vernácula — não para que os fiéis pudessem acompanhar em silêncio como uma opção, mas para tornar a “Missa dialogada” (ou Missa de Diálogo) a norma universal. “Vamos transformar a rotineira e monótona assistência aos atos de adoração em uma participação ativa e inteligente; vamos ensinar os fiéis a orar e a proclamar essas verdades em uníssono”, anunciou Beauduin (2).

A capela hoje na Abadia de Chevertogne fundada por Beauduin em 1925
Essa estratégia baseava-se apenas em suas próprias noções altamente subjetivas de participação leiga. Revelava um otimismo tolo quanto à promoção de um “espírito de comunidade”, fazendo com que todos os membros da congregação ladrassem como focas treinadas, com o padre como maestro.

Beauduin chegou a admitir que pretendia privar os católicos de seu método tradicional de participação, eliminando todas as formas de orações privadas que recitavam silenciosamente durante a Missa (3). Isso incluiria o Rosário, os exercícios devocionais ou mesmo as meditações individuais.

Em outras palavras, Beauduin queria que as respostas verbais coletivas fossem o único meio de participação leiga. Apenas a “oração litúrgica” seria considerada válida para os fiéis (4). Mas seu plano não parava por aí. Em seu programa de ação, formulado no Congresso de Malines, expressou o desejo de que, mesmo fora da liturgia, os fiéis abandonassem seus exercícios devocionais e modelassem suas orações segundo o Breviário clerical: por exemplo, recomendava que as Completas substituíssem as orações noturnas privadas.

Tratava-se, em essência, de um ataque à liberdade de cada fiel de orar como indivíduo, à sua própria maneira — liberdade essa posteriormente reafirmada pelo Papa Pio XII em 1947, na encíclica Mediator Dei (§ 108). O mesmo Papa censurou aqueles “que se deixam enganar sob o pretexto de restaurar a liturgia, ou que afirmam, com leviandade, que apenas os ritos litúrgicos possuem valor e dignidade reais” (ibid., § 176), e também rejeitou como “errônea e perigosa” qualquer tentativa dos reformadores de submeter os exercícios de piedade popular às normas e métodos dos ritos litúrgicos (ibid., § 184).

Participação silenciosa proibida

Um desejo ardente de acabar com a oração silenciosa e devoções privadas
É importante não subestimar a gravidade da proposta de tornar a Missa de Diálogo o modelo obrigatório de participação para todos os fiéis. Um costume secular de oração silenciosa — enraizado na fé e na prática de gerações de católicos — estava prestes a ser abolido, sacrificado no altar de um igualitarismo destrutivo, no qual a “participação ativa” de todos — clérigos ou leigos — é tratada como se possuísse o mesmo estatuto.

Foi também uma medida de cunho totalitário, em que o indivíduo é sacrificado ao coletivo. Os fiéis, instados a participar das respostas vocais coletivas, já não seriam livres para escolher o método de participação silenciosa que melhor lhes conviesse. A experiência demonstra que, para aqueles que desejam unir suas mentes e corações ao Santo Sacrifício que se realiza no altar, a lembrança interior pode ser perturbada pelas vozes alheias nos bancos ao lado.

A partir de então, onde quer que a Missa de Diálogo se estabelecesse, a atmosfera do culto católico no rito romano mudaria para sempre, à medida que as respostas faladas abafassem a participação silenciosa. Além disso, esta passou a ser tratada como um verdadeiro para-raios para o ódio dos reformadores litúrgicos. Hoje, é tida quase como uma afronta aos valores “democráticos” da “era dos leigos” inaugurada pelo Vaticano II.

Isso explica por que padres do Novus Ordo frequentemente reagem com uma mistura de horror e escárnio ao ver qualquer católico no banco dedilhando um rosário ou lendo um livro de orações no estilo tradicional — e por que expõem esses fiéis ao constrangimento diante da congregação.

A ponta de um iceberg

Os defensores da Missa de Diálogo e do canto congregacional afirmam que essas formas de “participação ativa” correspondiam ao que o Papa Pio X pretendia com seu motu proprio de 1903. Mas isso não passa de uma suposição sem fundamento, nascida do cérebro febril de Dom Lambert Beauduin, que pretendia iniciar uma revolução litúrgica para “democratizar” a liturgia (5).

Significativamente, não houve nenhuma demanda popular por parte dos leigos por “participação ativa”, nem tampouco desejo de assumir funções de caráter clerical. A Missa de Diálogo — que favorece essa inversão de papéis — foi apenas a ponta visível de um iceberg de “participação ativa”, cuja vastidão permanecia oculta sob a superfície na época de São Pio X.

Como os artigos seguintes demonstrarão, a data de 1909 — quando Beauduin lançou o Movimento Litúrgico — permanece como um marco do estado de degeneração ao qual a liturgia católica foi reduzida após o Concílio Vaticano II.

Continua

  1. Beauduin, La Piété de l’Église: principes et faits, Louvain: Monastery of Mont César, 1914, publicado em tradução inglesa por Virgil Michel como Liturgy the Life of the Church, Collegeville, Minnesota, 1926.
  2. Lambert Beauduin, Liturgy the Life of the Church, tradução de Virgil Michel, Collegeville, Minnesota: The Liturgical Press, 1914, p. 11.
  3. “Assim, todos os fiéis serão levados a renunciar às suas orações privadas durante as cerimônias sagradas – Missa e Ofício Divino” (Ainsi tous lês fidèles seron tamenés à renoncer pendant les office divins à larécitation de prières privées). Lambert Beauduin, “La Vraie Piété de l'Eglise, Rapportau Congrès de Malines 1909”, em Questions Liturgiques et Paroissiales, 40, 1959, p. 221, apud Marc Chatanay, Emergeance du Mouvement Liturgique en France, Pamplona, 2009, p. 215.
  4. Aliás, o fundador do Opus Dei, Mons. Josemaría Escrivá, tinha o mesmo objetivo. In The Way (um livro de máximas dirigido a Católicos, Cismáticos e Protestantes), Mons. Escrivá afirmou: “A sua oração deve ser litúrgica. Como gostaria de vê-los usando os salmos e as orações do missal, em vez de orações privadas de sua escolha” (n. 86).
  5. Keith Pecklers, The Unread Vision: Liturgical Movement in the United States of America, 1926-55, Liturgical Press, Collegeville, Minnesota, 1998, p. 11.